GENEBRA - O enviado da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Liga Árabe para a crise síria, Kofi Annan, quer que o Brasil envie tropas para integrar o contingente de observadores que será deslocado para monitorar um eventual plano de paz em Damasco e a implementação de um cessar-fogo.
A informação foi dada ao Estado com exclusividade pelo porta-voz de Annan, Ahmed Fawzi. A ONU espera delinear até a semana que vem um grupo de cerca de 250 homens que seriam enviados à Síria para garantir o cumprimento de um cessar-fogo, a partir do dia 12. Mas ativistas sírios, Annan e o próprio secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon alertam que a repressão ganhou força nos últimos dias, numa demonstração de que o regime de Bashar Assad não dá sinais de ceder.
Em Brasília, por meio de sua assessoria de imprensa, o Itamaraty informou não ter recebido pedido para o envio de soldados à Síria. A criação de uma força de paz, ainda de acordo com a assessoria, somente é feita depois de aprovada no Conselho de Segurança da ONU, o que ainda não se deu. Caso isso ocorra, informa o Ministério de Relações Exteriores, o Brasil estudará o pedido de envio, pois o País "acompanha com interesse a situação na Síria".
Annan deu um prazo até terça-feira para que o regime sírio e a oposição comecem a abandonar as armas e Damasco retire tanques e armas pesadas de centros urbanos. Com isso, um cessar-fogo amplo seria iniciado de fato na quinta-feira. O acordo também prevê que nenhuma cidade será alvo de uma nova incursão militar.
"Esperamos que no dia 10 o governo sírio tenha concluído a retirada de suas tropas dos centros urbanos", disse Fawzi. "A partir desse momento, começa um período de 48 horas, durante o qual cessarão totalmente todas as formas de violência por todas as partes, o que inclui o governo sírio e a oposição."
"Daí, então, esperamos que haja espaço para um diálogo político", disse Fawzi. "O cessar-fogo não é um fim em si mesmo. Tudo isso é para criar condições para que haja um diálogo na direção da democracia. Por isso, a missão de observadores é fundamental", disse Annan.
Para garantir o pacto, Annan iniciou nos últimos dias um dialogo com alguns governos sobre a possibilidade do envio dos soldados para a missão de observação. Os soldados seriam enviados desarmados e apenas com a missão de relatar se Assad e os rebeldes estão ou não cumprindo o acordo.
Fawzi indicou que o Brasil já foi procurado extraoficialmente e informado do interesse de Annan - acrescentando que, nos próximos dias, uma carta oficializando o pedido será enviada a Brasília. "O Brasil está na lista dos países que queremos que atuem", disse o porta-voz de Annan.
No total, Annan havia selecionado aproximadamente uma dúzia de países que gostaria de ver na operação. A lista foi feita com base nas características dos governos e na capacidade de serem considerados interlocutores tanto do Ocidente quanto do governo sírio.
Fawzi evitou dar mais detalhes, alegando que Annan "não negocia pela imprensa". Há duas semanas, o Estado relatou que Annan telefonou para o chanceler Antonio Patriota justamente para pedir apoio nos esforços de mediação na Síria. Já naquela ocasião, Annan antecipou a Patriota o fato de que estava pensando em enviar a missão de 250 observadores para a Síria.
O Brasil mantém tropas no Haiti e uma fragata no Líbano. Na visão da ONU, o envio de soldados credenciaria o Brasil a novos esforços de paz no Oriente Médio. Para Annan, a missão na Síria teria um formato pouco tradicional. "Não há um front ou linhas determinadas separando a oposição e o governo. Não podemos ter uma força tradicional de manutenção da paz", disse Annan à Assembleia-Geral da ONU. Segundo ele, essa força deve ser relativamente pequena, flexível, ágil e ter acesso a todo o país em segurança.
Na quarta, uma equipe avançada de sua missão desembarcou na Síria para já começar a negociar de que forma os observadores militares atuarão. Para liderar a implementação de um acordo, Annan escolheu o general norueguês Robert Mood, que já está em Damasco.
Sem trégua
A esperança de Annan de um cessar-fogo vem justamente no momento em que ativistas alertam que Assad tem intensificado os ataques. Para a oposição, Assad estaria ganhando terreno antes do cessar-fogo, enquanto 2,3 mil refugiados sírios cruzaram a fronteira com a Turquia nas últimas 24 horas, segundo o governo de Ancara.
De acordo com a Anistia Internacional, 232 pessoas morreram na Síria desde que Assad afirmou ter aceitado considerar o plano de paz de Annan, na semana passada. O governo sírio, porém, relata que, na realidade, está retirando suas tropas de Deraa, Idlib e Zabadani.
O Estadão