31 janeiro 2012

O DESAFIO DA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE

O ser humano possui identidade, característica e vontades particulares, condições estas que lhe conferem uma unidade física e emocional própria. Nós, médicos, ao convivermos com o paciente, deveríamos desenvolver o dom de percebê-lo como único e, ao tratá-lo, individualizá-lo, compreendendo suas vontades, medos, fantasias e limites.

A busca pelo médico, com ou sem sintomas, é sempre um momento de apreensão, expectativa e interrogações. Cabe a nós entendermos estas sutilezas da alma humana, sabendo compreender, ouvir e respeitar queixas e “queixumes”, fatos e fantasias, realidade e ilusões.

A relação humana é sempre única, quer seja na amizade, no amor, nas desavenças e, em especial, na relação médico-paciente. O desafio de abordar tal assunto é que ele seria infindável como é o número de relações médico-paciente. Cada encontro forma um par com especificidades e visões próprias. A relação médico-paciente, embora possa envolver o mesmo médico, altera-se por diversos motivos: ora atendemos um jovem, ora um idoso, ora um escritor consagrado, ora um taxista lamuriento. Enfim, são sempre relações únicas, conjunto que não se repete. A cada atendimento deve o médico adequar-se àquele que sofre, que traz suas queixas e inseguranças.

Devemos nos adaptar a cada qual com sua história de vida e mazelas. Por vezes, a queixa parece simples, porém, pode esconder problemas interiores, físicos e emocionais, muito mais graves e sérios. A decodificação de sintomas é uma arte que melhor qualifica o médico. Por vezes, parece-nos absurdo o sucesso de determinado médico, não tão acadêmico, mas suficientemente receptivo e generoso que acolhe profundamente aqueles que o procuram. O sucesso está na receptividade, no saber ouvir, em mostrar-se parceiro do sofrimento alheio.

É, pois, a relação médico-paciente a arte de perceber-se e colocar-se no lugar do outro, compreendendo seus conflitos e necessidades.

Num dos livros mais consagrados de Medicina Interna “Harrison” em sua 1º edição na década de 1950 encontra-se uma mensagem que creio bem definir o que buscam nossos pacientes.

“Espera-se que o médico tenha tato, seja simpático e compreensivo porque o paciente não é apenas um conjunto de sintomas, suas funções desordenadas, o paciente é um ser humano com seus próprios medos e esperanças, que está em busca de alívio, ajuda e conforto. O verdadeiro médico tem um interesse Shakesperiano por sábios e tolos, por orgulhosos e humildes, pelo herói estóico e pelo patife lamuriento. O verdadeiro médico se preocupa com o ser humano.”

Ao concluir ressalto o mundo inimaginável em riqueza, emoção, dificuldade e incertezas que envolve a relação médico-paciente e a beleza de estudá-la cuidadosamente, pois esta é a arte da medicina.
Jornal do Brasil

Nenhum comentário: